quarta-feira, 27 de abril de 2011

Blues leaves, cherry tree

Under the tall cherry tree
Is my body forever buried
Oh ye Gods, let me be free
Too long have I here tarried

Reaped, thy leaves naught red
Dripping rubies and blossom
Underneath the buried dead
Life's elixir made wholesome

Fathom, something's amiss
An odd question on queue
Sealed, bound with a kiss
Why are my cherry tree's leaves blue?

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Disappointment

Não há qualquer hipótese, não deu mesmo para escrever ultimamente, tenho estado terrivelmente ocupado... Terei, pelo menos, todos os temas que prometi desenvolvidos minimamente até ao final do mês, mas mais do que isso não creio que consiga :/

Oh well, a vida vai dando mais trabalho do que pensamos.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Isto está complicado

Como já se aperceberam, estão a ocorrer uns quantos atrasos com os posts.

Dificuldades imprevistas, está a ser muito desagradável e não gosto de faltar a compromissos. Vou ver se hoje consigo reservar um par de horas, para pôr o blog em dia!

sábado, 16 de abril de 2011

Nada de especial para dizer

Não sabendo o que havia de escrever, decidi-me por partilhar algo do meu íntimo, da forma como sinto os outros e a minha expressão de desagrado e desapontamento por expectativas que, tolamente, continuo a criar, dia a dia. Pois, estou desapontado comigo também por, ainda hoje, ir criando expectativas, sabendo de antemão que nunca tal dá bom resultado… Isso leva-me a questionar se essa tendência não se encontrará de tal forma entranhada na minha mente, que eu não serei nunca capaz de a controlar. No entanto, já controlei outros aspectos, de uma forma que já me chegaram a referir como desumana (não gosto dessa expressão, preferia que dissessem algo como “frio” ou talvez um pouco excessivamente racional, mas nunca desumano), por isso pode ser que também as expectativas venham a encontrar o seu fim consciente.

Enfim, não ando particularmente satisfeito, estou a passar por uma fase um pouco depressiva (mais que o habitual) e a fase eufórica teima em permanecer dormente, não me permitindo esse estranho equilíbrio das flutuações de humor. Pior do que isso, a meu ver, é que a minha criatividade é muito inferior (assim como outras “tarefas” cognitivas) quando me encontro deprimido, o que certamente demonstrará a qualquer indivíduo a minha peculiar necessidade da minha particular psicopatologia… Sim, digo necessidade, pois embora a sociedade possa ver a minha mente como doente, sei que há em mim um potencial de acrescentar muito de valor a este Mundo. Potencial esse que nem se teria revelado se eu fosse, simplesmente, “normal”, como parece ser a moda hoje em dia. O estranho e o diferente serão sempre vistos com maus olhos (e não julgam que pertencer a uma qualquer subcultura vos torna menos normais, porque a verdade é que continuem bem dentro dos parâmetros habituais).

Sou feliz, suponho. Desde há um bom tempo, não estou feliz, sou feliz. Encontrei um propósito maior, a minha mente revelou-se a si mesma e aprendi que não me é possível simplesmente não gostar de algo, porque sinto que tenho coisas a aprender, precioso conhecimento a obter, de absolutamente tudo. Encontro-me particularmente satisfeito pelas transformações que tenho sofrido recentemente, pela visão mais abrangente que me tem sido “permitida”, por pensar em coisas pouco habituais e poder desenvolver as minhas próprias ideias (vocês percebem o que quero dizer, não falo em apropriar-me das minhas ideias, mas de tentar acrescentar algo novo). Por outro lado, sinto uma certa insatisfação pelo desinteresse (omisso ou expresso, tanto faz) que as pessoas parecem ter para com Política, Religião, Economia, Ética e tantos outros assuntos interessantes! Dou por mim a não compreender bem porque é que alguém não teria interesse em saber mais (o quê? Tudo) e opiniões e ideias baseadas em informações de noticiários da noite ou preconceitos não me convencem nem um pouco…

O que é que nos aconteceu? Não é possível que tenhamos estupidificado ao longo do tempo, será? De facto, não temos uma variabilidade genética notável e há uma tendência natural para a homogeneização, mas ainda assim acho suspeito o quão mais “bruta” se tem tornado a nossa sociedade… Nos tempos mais antigos, parecia tudo tão mais profundo, suave, propositado, embora reconheça também que esta opinião possa ser enviesada pela minha relutância em entrar em parâmetros normalizados da sociedade, assim como esta parece ter alguma relutância na minha total assimilação (e de todos os indivíduos, felizmente!), por isso o futuro permanece uma enorme incógnita. Apesar de tudo, creio que estamos a aproximar-nos de uma qualquer encruzilhada e que muito do futuro da nossa espécie possa vir a ser decidido ao longo das próximas décadas (não o penso apenas com base nos dados que nos vêm a ser apresentados, mas é também uma espécie de aversão instintiva a uma instabilidade que se tem revelado mais profunda do que qualquer pessoa teria pensado ainda há poucos anos atrás… E acho que ainda só assistimos à ponta do icebergue).

Bem, para quem não sabia sobre o que escrever, ainda saíram umas quantas palavritas. Vejo também que acabei por não conseguir expressar-me emocionalmente como desejava, parece haver uma barreira… Tentarei expô-lo amanhã, pois não acredito em guardar nada para mim. O nosso trabalho intelectual, seja de que tipo for (quer seja mais virado para a arte ou para o “estudo”) é de tal forma valioso que me parece um pequeno delito, para dizer o mínimo, não o partilhar com o Universo.

Com isto me despeço, boa noite a todos!

sexta-feira, 15 de abril de 2011

If all I show is a mask

There was a time
I was young then
Always felt fine
The mind was zen

It could not last
I soon felt weak
Life's spent too fast
Future is bleak

The time to find
Some new resolve
Flies through the mind
Had to evolve

Had to create
A brand new sham
Ways to berate
Myself, the lamb

Now I am my
Own sir and lord
Evades the eye
True self ignored

They took no notice
And would not ask
And are left guiltless
If all I show is a mask

quinta-feira, 14 de abril de 2011

De Namar


Apresento-vos uma página-esboço de um livro que comecei a escrever há algum tempo. Ainda não está sequer perto daquilo que espero atingir, mas já dá para se ter uma vaga ideia do estilo de escrita, alguns nomes que criei, etc..
Podia escrever algo mais para contextualizar esta cena, mas não quero estragar a piada do aspecto final que o livro terá. Uma coisa vos prometo, se consideram que há poucos escritores portuguese de High Fantasy de qualidade, eis que pretendo juntar-me a essa pequena e elitista lista, sim? A minha história está a começar a surgir nuns moldes, aaah, tão belos, tão delicados, tão verdadeiros. Está a ser um prazer vê-la a desenrolar-se na minha mente e, lentamente, tomar forma física em papel (bem, papel virtual, já que estou a usar o Word, mas vocês percebem). Enfim, espero que gostem.

(Draija a dirigir-se a Bareth)
  - Coloco-me à tua frente, mas não me vês. Toco-te, mas não me sentes. Não sei se alguma vez o poderias ter feito, mas agora não conseguirás certamente, pois tens um compromisso para com todos nós.
  Uma única lágrima foi vertida, traçando-lhe um rasto luzidio no rosto. E essa lágrima incendiou em Bareth uma paixão que não se teria feito prever, pois antes que qualquer consideração pudesse ter sido tida em conta, já ambos haviam colidido selvaticamente.
  Enquanto as roupas eram descartadas, arrancadas dos corpos com uma sofreguidão animalesca, os lábios colavam-se e exploravam-se, separando-se apenas pelos momentos necessários para recobrar o fôlego, pois esta noite não se repetiria. Mãos procuravam, frenéticas, tocar o outro em formas que uma há muito não conhecia e o outro jamais conhecera; procuravam agarrar-se a algo mais que o corpo um do outro, a futuros que não poderiam acontecer, a tempo perdido e consolações para mágoas tão cruelmente despertas.
  E a chama tão cedo não se apagou, pois enquanto o conforto da luxúria dos corpos lhes permitiu, não permitiram que o ominoso futuro a aproximar-se se intrometesse. Dois corpos, sedentos de vida, e as roupas, pelo chão espalhadas, um estranho mosaico, mutável, belo.
  Mas todas as noites têm um fim, quer seja esse fim próximo ou não, e ambos caíram, eventualmente, exaustos, ainda nos braços um do outro. O cansaço e o sono tomaram então posse e ambos dormiram, enquanto Erion impedia a luz de Elin de incomodar quaisquer seres. A terra não era ainda banhada por uma subtil luz, o sol abaixo do horizonte, a noite calma estendendo-se efemeramente e um momento para sempre cristalizado no Tempo.

  O despertar surgiu a Bareth como algo  contraditório, cheio de felicidade por uma experiência que o acalentaria até ao fim dos seus dias e a terrível dor e pesar da impossibilidade de permanecer, alheio aos problemas de Namar, ou, pelo menos, prolongar a sua estadia por uns dias. Apenas mais uns dias, por um pouco de descanso, a possibilidade de viver um amor que não se havia até então permitido… Não poderia ser.
  Uma única lágrima foi vertida, enquanto se vestiu e preparou, tendo o cuidado de não despertar Draija, rezando a Rajh por um caminho claro à sua frente e a Sheter pela protecção da sua alma, pois a jornada seria árdua e perigosa. Uma única lágrima vertida, pela perda de uma inocência que nunca havia sido.
  Ao aproximar-se da orla da povoação, as sentinelas não o impediram nem o questionaram, como até há pouco tempo teriam feito. Olharam-no apenas com o que parecia ser um ar calmo de quem vê alguém a ir de encontro ao seu destino, os seus semblantes sérios e respeitosos, uma despedida silenciosa. Mais não seria necessário ou próprio. Partiu então Bareth, em direcção às planícies do sopé da montanha, com Ark’Namar como destino.

Na privacidade da sua tenda, finalmente só, chorou Draija a partida de quem não esperara desejar e amar tanto, mas foram principalmente lágrimas de felicidade, pelo futuro que Bareth poderia comprar a Namar.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Undefined ramblings



Depois do post de ontem, nem sei que hei-de escrever... Tenho uma ideia de algo para vos mostrar, amanhã ou no dia seguinte, mas hoje não me ocorre mesmo nada...

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Da Ética, o valor intrínseco e a alimentação humana

Este texto começa como uma espécie de aula. Não particularmente aborrecida, mas não é para todos... Alguma vez se perguntaram acerca do valor das coisas? Será que as coisas valem apenas pela utilização que lhes damos ou terão algum valor intrínseco? Se pensarmos nas coisas como objectos, então a tendência será utilitarista, o único valor é instrumental... Mas e se estivermos a falar de outros seres vivos? Se estivermos a falar de outros indivíduos, reconhecemos que eles têm valor intrínseco, porque nós também temos. Porque cremos que há algo de extremamente especial e diferente em nós que nos dota de uma espécie de valor que não existe no resto do Universo. Que visão tão egocêntrica, tão antropocêntrica, tão... Humana. Esta visão de que apenas o ser humano tem qualquer valor intrínseco é a base do Antropocêntrismo.

Então e outros seres vivos como os cães, gatos, golfinhos e por aí fora? Somos até capazes de os reconhecer como sendo inteligentes, criamos laços afectivos com eles. Eles têm até uma certa capacidade de aprendizagem e parecem demonstrar emoções... Sentem prazer e dor. Serão meros utensílios ou ferramentas? A maioria das pessoas vê-os como tendo valor próprio e eu vejo-me obrigado a concordar. À ideia de que qualquer ser vivo capaz de sentir dor ou prazer é dotado de valor intrínseco, chamamos de Sencientismo.

Mas será que nos podemos ficar por aqui? Então e seres vivos como os insectos ou as plantas? Incapazes de sentir dor ou prazer, serão meras ferramentas por essa razão? Eis uma excelente questão, uma que muitos já tentaram responder usando os mais variados argumentos, mas aquilo que eu vos pergunto é o seguinte: já viram uma lesma ou um caracol contorcer-se quando em contacto com sal? Segundo os padrões humanos, esses seres vivos são incapazes de sentir dor, mas então porque é que se contorcem? Não me parece que estejam propriamente confortáveis, nem creio que tenham qualquer apetência particular pela morte. Aí está o cerne do problema, também estes seres "desejam" viver, não nascem com um mero intuito cego de morrer passado algum tempo. Reproduzem-se, vivem, evoluem! Não é isso uma demonstração de valor intrínseco?

E quanto às plantas? Também não sentem dor ou prazer segundo os nossos parâmetros, pior do que isso, não se parecem mover ou fazer algo para se resguardarem de danos exteriores, mas estudos (não tão recentes) já demonstraram que as plantas, quando numa situação de morte iminente (que, geralmente, ocorre de forma mais lenta que a maioria dos outros seres vivos, libertam quantidades enormíssimas de químicos que aceleram o metabolismo e, geralmente, têm o intuito de espalhar a sua semente pelo ar, para que a sua espécie continue, viva, evolua, perpetue-se... Eu estranho como é que alguém é capaz de olhar para estes comportamentos inatos, reflexivos, mecânicos e e achar que isso é justificável da sua instrumentalização e desconsideração de valor intrínseco... Se vos agredirem, reagem conscientemente? Eu diria que é maioritariamente por instinto, perdoem-me se estou a fazer uma assunção incorrecta. Enfim, esta ideia que expressei nestes dois últimos parágrafos tem o nome de Biocêntrismo e considera que todos os seres vivos, dos microorganismos aos macroorganismos, são dotados de valor intrínseco e não apenas intrumental.

Ah, mas há ainda algo em falta! Poderiam pensar que já estando todos os seres vivos incluindos no Biocêntrismo, não teríamos que continuar a chatear-nos com o valor intrínseco das "coisas", mas a verdade é que tanto o Antropocêntrismo, como o Sencietismo e o Biocêntrismo têm uma ideia em falta: os ecossistemas, as espécies, as entidades supraindividuais. As três considerações éticas que antes referi, quanto ao valor intrínseco, focam-se em entidades individuais, mas também as espécies e os ecossistemas podem ser afectados como um todo, correcto? Não afectamos apenas seres individuais, a poluição de um lago, por exemplo, não causará danos a um peixe em particular, mas a toda a sua espécie. As influências num ecossistema são imensas e um ecossistema é mais que a soma de todos os seres vivos que o compõem, pois também o habitat, o próprio solo, o clima, etc., tem um determinado valor, pode ser afectado por forças externas, não é isso justificação suficiente para se considerar que tenham valor intrínseco? Já muitos indivíduos assim pensaram e argumentaram nesse sentido... A esta ideia chamamos de Ecocêntrismo e é nesta consideração ética do valor intrínseco que eu me insiro.

Agora chegou a altura de partir para um campo mais específico e mais práctico (nada práctico, como verão, mas é mais por uma questão de aplicação): a nossa alimentação.

A verdade é que, antropocêntricos, consideramos consumir outro ser humano como moralmente incorrecto... Mas então e os outros seres vivos sencientes? As vacas, cavalos, baleias e por aí fora. A maioria consegue reconhecer que estes seres são dotados de valor intrínseco, então como é que são capazes de os criar e matar para deles se alimentarem? Certamente compreenderão o quão moralmente incorrecto isso é, não? Mas e os seres vivos não-sencientes? As plantas, os moluscos, insectos?

Não sentem que ainda estamos em falta? Onde é que está a consideração do valor da vida e do direito à vida (e qualidade de vida!) de qualquer ser vivo? É também moralmente incorrecto alimentarmo-nos das plantas e esses animais que consideramos... Inferiores (engraçado que esta ideia demonstra-nos que até os vegetarianos e vegans estão errados, aliás, nem consigo pensar em ninguém que esteja correcto neste aspecto)... Inferiores, deveríamos ter vergonha de alguma vez considerarmos outro ser vivo como sendo inferior, como se tivéssemos algum direito superior à vida. Acho a ideia ridícula. A verdade é que cheguei à conclusão que é eticamente e moralmente incorrecto para o ser humano alimentar-se ou prejudicar, pela sua acção e pensamento, qualquer ser vivo e sei que a minha argumentação não só é lógica como sólida, e isso torna-se algo assustador, não?

Quem sabe... Se calhar não o sentem como eu, não vêm quão incorrecto é, tudo por uma questão de causalidade, de "termos que viver, certo"? Certo? Quem é cada um de nós para decidir sobre a vida ou morte de outro ser? De onde parte essa superioridade moral? Não vos incomoda minimamente a forma como o ser humano se desenvolveu até hoje? Somos piores que parasitas, verdadeiramente, utilizamos tudo como meras ferramentas, somos tendencialmente antropocêntricos, egocêntricos e estamos a destruir o nosso planeta (não apenas os seres vivos que nele habitam, mas o próprio planeta). Isto quer dizer que sou capaz de deixar de me alimentar e simplesmente morrer? Infelizmente, não. E digo infelizmente, pois assim é, sinto-me hipócrita por ter uma certeza tão grande da conclusão moral a que cheguei quanto à alimentação e, no entanto, quase nada consigo fazer quanto a isso. Essa é apenas uma das razões pelas quais sinto um profundo ódio por mim mesmo, por não encontrar alguma solução (não tenho o intelecto para isso) e mal consigo sequer passar estas ideias a outras pessoas... Que cansaço.

Mas há uma pequena luz ao fundo do túnel, alguns poderão ter começado a aperceber-se de algumas possibilidades de alimentação, enquanto liam o último parágrafo... Vejamos a forma como as plantas se alimentam, sem prejudicarem outros seres vivos (excepto em situações raras), crescendo e perpetuando-se de uma forma sustentável, atentem nessa palavra: sustentável! Água, minerais no solo, o processo de produção de energia que ocorre por acção do Sol, graças ao cloroplasto das células vegetais... Se conseguíssemos reproduzir essa produção de energia num ser humano, poderíamos ter aí a resposta a este dilema moral que eu considero gravíssimo, mas não há grande investigação nessa área, considera-se uma quase impossibilidade, os custos seriam certamente exorbitantes e a verdade é que nós passámos a viver à base do dinheiro. Somos uma sociedade do dinheirismo, tanto que já mal conseguimos encontrar sociedades que não tenham alguma espécie de troca directa ou monetária que regule as suas relações interpessoais, e por essa razão, provavelmente nunca conseguiremos alcançar esse caminho melhor, ético (pelo menos, não tão pouco ético como o que hoje caminhamos).

Enfim, nesta altura pensarão já que eu sou semi-louco, ou mesmo louco, mas ainda nem vos expressei a minha ideia mais chocantes relativamente a este tema... Pois, é verdade... Faltou-me ainda referir a questão da causalidade, à qual me referi apenas brevemente, há uns quantos parágrafos. Então e a morte natural? A morte por causas naturais, velhice, doença e todas as outras possibilidades. Seria incorrecto alimentarmo-nos de um ser que morreu por causas naturais?

Qualquer ser vivo, aquando da sua morte, torna-se um mero objecto orgânico que começará a apodrecer, a ser lentamente consumido por microorganismos, permitindo a continuidade do ciclo da vida. E a questão que eu levanto é a seguinte: será moralmente incorrecto alimentarmo-nos de seres vivos que morreram naturalmente? Eu considero que não. Um ser vivo morto (não gostei nada de escrever isto) tem uma ligação meramente material com a realidade. Não pode amar, não pode sentir prazer ou dor, não cria relações com o meio envolvente e outros seres, é um mero objecto, uma ocupação de espaço e qualquer ideia que tenhamos de uma ligação com um ser que já faleceu, não parte do próprio ser, mas de nós. Resquícios de emoções, apegos afectivos por, essencialmente, meras coisas, objectos orgânicos. Faz parte da nossa cultura, é algo que nos é incutido desde jovens, temos cultos dos mortos em todas as sociedades e culturas, das mais variadas formas, mas todos eles são relativamente sem-sentido, pois todos partem de relações com seres que já o não são, relações com memórias e experiências, relações com algo que está apenas dentro de nós...

Pergunto-me se alguém já viu aonde eu quero chegar... Pode ser que sim, se tiverem uma ideia básica de como as minhas linhas de pensamento se desenvolvem, ou talvez porque também já o pensaram mas abominam a ideia, nunca saberei se não o disserem... É verdade, após a morte, como em vida, não faço distinção de valor intrínseco entre qualquer ser vivo, ênfase no qualquer. Vou deixar-me de rodeios, pô-lo em palavras simples: ao longo deste texto, das ideias que expressei e das conclusões morais a que cheguei, defendo que as únicas formas moralmente correctas de um indivíduo se alimentar são uma espécie de alimentação inorgânica (ainda bastante fora do nosso alcance) e a necrofagia. Incluindo aí a necrofagia humana. Comer outros seres vivos que morreram de causas naturais, incluindo humanos.

Com isto me despeço, deixo-vos ideias bem mais complexas e prácticas em que pensar que o habitual. Não me tomem por tolo ou irrealista, não sou nem um nem outro e, mesmo reconhecendo as possíveis consequências da expressão desta ideia, aqui se encontra a base moral da minha visão da valorização intrínseca da vida e do fenómeno (humano) de alimentação, em todas as suas formas.

domingo, 10 de abril de 2011

A dor e as filosofias de felicidade


Volto a pegar no tema da dor... Porquê? Porque creio ser um dos fenómenos mais fascinantes que é possível um indivíduo experienciar, porque creio que a dor é um dos caminhos para a aprendizagem e o conhecimento e porque creio que há ainda muito a ser dito.

Pegando nalgumas das ideias expressas no meu último texto sobre este tema, foco a relevância de se interiorizar que a dor é das experiências que mais partilhamos com qualquer outro indivíduo, logo devemos fazer por compreendê-la e empatizarmos com quem sofre. É também importante perceber que a dor não é nunca um fenómeno puramente fisiológico ou puramente psicológico, é uma conjunção destes aspectos, com um impacto moral muito próprio, muito pessoal. Tomando ainda em consideração que a própria experiência da dor (como quem diz, o processo de aprendizagem do que é a dor, as formas que assume e como lidar com ela) é grandemente influenciado pelo meio ambiente, é fácil perceber-se como a cultura em que um indivíduo se insere vai afectar a sua relação com este fenómeno e o Mundo.

Mas não vou voltar a abordar estes aspectos, não quero repetir-me (em demasia, eu sei...) e já expus algumas das principais ideias, por isso vamos então fazer uma viagem pela forma como a Filosofia vê o fenómeno da dor, a sua relevância para o indivíduo e as suas relações interpessoais. Tratarei então de abordar as perspectivas do estoicismo, do epicurismo e do hedonismo (os dois últimos são geralmente confundidos, também farei por esclarecer esse mal-entendido).

Começando pelo estoicismo, com o qual mais me identifico, vou indicar algumas das suas principais características: teve origem na Grécia antiga, no século III a.C., foca-se numa ideia de indiferença em relação a tudo o que é externo ao indivíduo, com o objectivo de se alcançar uma relação de profunda comunhão com a razão universal (ou ordem natural das coisas). É fácil então compreender que o estoicismo é tendencialmente imaterialista e vê a causalidade como algo que qualquer indivíduo, através da razão, deve reconhecer e fazer por influenciar o menos possível a realidade à sua volta.

A dor existe para o estoicismo, mas é apenas sinal de que, de alguma forma, o indivíduo não foi capaz de aceitar a realidade como esta se expressa, nem foi capaz de usar a sua razão para melhor fazer uso dos objectos que se encontram à sua disposição, sem se deixar levar por paixões ou apegar a esses mesmos objectos, de forma a alcançar verdadeira liberdade e felicidade.

Ainda anterior ao estoicismo foi o epicurismo (que o influenciou grandemente, ao contrário do que a maioria pensaria), que surgiu no século IV a.C. e foca-se na procura de prazeres modestos (não os prazeres carnais, mais físicos, mas prazeres como a discussão e a busca de conhecimento), com o objectivo de atingir a ataraxia (um supremo estado de tranquilidade), a libertação do medo e a ausência do sofrimento corporal. Estranho quanto possa parecer numa filosofia que declara o prazer como o único valor intrínseco (uma ideia em comum com o hedonismo e que é a principal razão para a maioria das pessoas confundir estas filosofias), um dos aspectos mais importantes na vida de um epicurista passava pela limitação dos desejos... Uma das principais ideias desta filosofia, com a qual me custa a identificar, é a visão da dor como sofrimento corporal, mas tal seria de esperar de um filosofia com foco no empirismo e uma percepção do Mundo física atomista.

A dor existe para o epicurismo, mas ao contrário do estoicismo não é vista como um mero "erro" por parte do indivíduo, por não conseguir seguir certos comportamentos ou mudar a sua forma de ser de modo a aceitar toda a realidade. A dor seria então algo externo e manifestava-se através de estímulos enviados pelo meio envolvente, e com essa ideia sou capaz de me identificar parcialmente.

Resta então abordar o hedonismo, uma doutrina filosófica que afirma que o prazer é o supremo bem da vida humana e, nos tempos modernos, passou a afirmar que o prazer deve ser entendido como a felicidade para o maior número de indivíduos. Enquanto que o epicurismo passa pela aceitação do prazer, o hedonismo passa pela procura activa do prazer, razão pela qual não deveriam ser confundidos. Esta filosofia surgiu pela mesma altura que o epicurismo e diz-nos que o prazer, independentemente da sua origem, tem sempre o mesmo propósito e a mesma qualidade, sendo que o único caminho para a felicidade é a busca do prazer e a diminuição da dor.

"Diminuição da dor", eis uma ideia interessante! A dor não é vista como um erro, tão pouco é uma mera expressão do meio envolvente, mas é considerada um fenómeno presente em todas as coisas, simultaneamente interior e exterior ao indivíduo, que é impossível de eliminar e deverá então ser compreendida e identificada, para que se possa diminuir o seu prejuízo ou dano. Engraçado que eu, não me identificando de todo com o hedonismo, vejo esta "posição" quanto à dor como sendo bem mais consciente e prática.

Introduzindo aqui uma nota pessoal, para que isto se pareça menos com uma aula de História, a minha escolha de uma filosofia de vida veio revelar-se como uma uma conjunção do estoicismo, epicurismo e hedonismo, com mais ênfase no primeiro e ainda umas quantas outras influências do utilitarismo e cinismo (quando falo de cinismo, não falo na sua caracterização moderna, mas na filosofia de desapego aos bens materiais e externos), entre outras. Sou um defensor da causalidade, reconheço uma ordem natural das coisas e faço por segui-la, sou principalmente estóico. Adopto uma posição de plena aceitação da realidade, incluindo as suas manifestações mais dolorosas (e nesse aspecto, difero da maioria das filosofias do bem-estar), pois mesmo dessas experiências desagradáveis consigo retirar conhecimento e daí advém prazer, revelando-se aqui a minha "subtil" influência do epicurismo.

Quanto ao hedonismo, só concordo mesmo com a visão da realidade mais complexa que é a dor, pois não levo uma vida de procura activa de prazer. Não vejo aí um caminho para a felicidade e entristece-me que esta seja, sem sombra de dúvidas, a filosofia de vida mais comum, nos tempos modernos.

High Tier: Estoicismo
Mid Tier: Epicurismo
Low Tier: Hedonismo

Mas cada uma fará as suas decisões. Espero apenas que seja capaz de as questionar frequentemente e compreender as implicações internas, externas, morais, sociais e espirituais da sua escolha, de modo a procurar alcançar o melhor para si mesmo e toda a realidade à sua volta. Com isto me despeço, amanhã haverá mais.